quarta-feira, 25 de junho de 2008

Barro e semente

Quebrei a pedra
Revirei-a pelo contrário de sua aspereza
Esfarelei o pó entre os dedos
Lavei o rosto com a imundície de minhas mãos
Chorei
[ desenhando fuligem no rosto
Cavei mais uma vez na sujeira nos meus dedos
Molhei a terra
Enfiei-me no barro de mim mesmo
Tornei-me cerâmica
[minha casca deformada
Queimei para ficar rígido
Bati para ouvir meu som
Olhei para admirar a cor
As formas todas absurdas
Inacabadas
Tornei-me cego, insensível
Paralítico.

domingo, 15 de junho de 2008

Haicai


Ele não é seu filho!
Descascaram-se as paredes...
Foi só o tempo de puxar o gatilho.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

"São as sombras num belo quadro"

“As aranhas vinham e começavam a devorá-la: suas boquinhas douravam-se
no trabalho luminoso de consumir o verbo afetivo, o amor materno, puro verbalismo”
Ferreira Gullar, Histórias e guerras de meu povo.


Buzinas. Como eu as odeio,
mas vamos rápido, o tempo esvai-se.
- Sua mãe teve sífilis quando estava grávida e seu pai deixou-a para morar com o tio? Só há esta explicação! Vai se tratar seu doente! Você mente com os olhos ! Você mente com os olhos !
- Você entendeu tudo errado...
- Você mente com os olhos...
Eu não estava mentindo.
“ Eu sempre guardo minha Cabeça debaixo do braço, para não esquecê-la em local algum. Para sempre ficar sentindo o odor que vem do meu suvaco que eu nunca lavo porque eu nunca largo a minha Cabeça que está debaixo do meu braço, para não esquecê-la em local algum. Para sempre ficar sentindo o odor que vem do meu suvaco que eu nunca lavo porque eu nunca largo a minha Cabeça que está debaixo do meu braço para que...”
Prefiro acreditar em mim.
- Ei! Peraí!
Tomaram-me novamente os papéis, arquivaram-nos novamente.
Quem os lerás? O que estes homens brancos vestidos de branco fortes rápidos, têm contra meus papéis?
Buzinas... como eu as odeio.

(Trecho do conto "São as Sombras num Belo Quadro" ainda inédito)

terça-feira, 3 de junho de 2008

As Fotos de Juliano...


Pois foi que mais uma vez recebi fotos de Juliano... Desde a última na qual apareciam os Ipês com a seguinte frase "não é primavera mas os ipês já estão florecendo". Nesta última que está acima a frase da vez foi "Dogville" uma ótima lembrança do cão junto a casa, último sobrevivente daquela cidade dos sonhos (me vem a mente agora Mulholland Drive...mas isto já é outra estória).
Muito bonitas as fotos, principalmente pelo inesperado das cenas comuns que nossos olhos viciados do cotidiano não apreendem mais... aí deixamos que as câmeras captem e eternizem isto por nós... momentos nos quais nos inebriamos de tanta beleza que vamos lá de novo, naquele local onde foi tirada a foto e olhamos novamente... continuamente, linearmente... e às vezes nos perguntamos: onde foi parar nosso olhar? Dentro dessa discussão cabe lembrar a famosa "cena do saco" de Beleza Americana (que por coincidência foi encenada por Juliano em um jogo sobre filmes) na qual um mero saco deixando-se levar pelo vento em frente a um muro, desperta o olhar para a beleza da vida...
São momentos como esses (jogos sobre cinemas, fotos chegando pelos correios, filmes assistidos juntos...) que me nostalgiam, que me fazem lembrar que: BERNINI É O REI DA MADRUGA!
Nessas circunstâncias nas quais me encontro, chegar em casa cansado do trabalho, embrutecido de realidade, vítreo, e encontrar uma correspondência dos correios com fotos como estas me fazem lembrar quem sou e quem são as pessoas ao meu redor...
Fragmentam-se as linhas sobre o asfalto...